Letícia Casado | O presidente Lula (PT) tem priorizado homens em detrimento de mulheres nas escolhas para os ministérios, para o Judiciário e para a política externa, descumprindo a promessa feita na campanha de trabalhar pela paridade de gênero.
Na Esplanada, os homens ocupam os ministérios com mais visibilidade e orçamento. No Judiciário, Lula priorizou homens nos tribunais regionais, indicou dois ministros para o STF (Supremo Tribunal Federal) e outro homem para a PGR (Procuradoria-Geral da República).
Na política externa, Lula nomeou embaixadores para liderar os fóruns internacionais que o Brasil preside entre 2024 e 2025 —G20, Cúpula do Brics e COP30—, além de escolher um homem para o Itamaraty e outro como assessor internacional da Presidência.
A cientista política Denise Andrade, da Unichristus e da FGV, diz que o fato de mulheres ocuparem cargos de visibilidade e poder é importante para a formulação de políticas públicas. "É mais fácil ver as mulheres tentando refletir e desconstruir estruturas e práticas em prol de igualdade de gênero do que os homens fazendo isso."
Pastas delas têm menos verba e peso político
A maior parte dos ministérios ocupados por mulheres têm baixo poder político, orçamento restrito, entrega pouco perceptível pelo eleitorado ou são "identitárias": Cultura (Margareth Menezes), Ciência e Tecnologia (Luciana Santos), Povos Indígenas (Sônia Guajajara), Igualdade Racial (Anielle Franco), Mulheres (Cida Gonçalves) e Direitos Humanos (Macaé Evaristo).
No geral, são pastas pouco ou nada cobiçadas pelos aliados ou por partidos do centrão.
A ministra com mais visibilidade no atual cenário é Marina Silva (Meio Ambiente). Duas mulheres fazem parte da área econômica do governo, Simone Tebet (Planejamento) e Esther Dweck (Gestão), mas o rosto da economia é um homem, Fernando Haddad (Fazenda).
Os maiores orçamentos na Esplanada estão com Carlos Lupi (Previdência), Wellington Dias (Desenvolvimento Social) e Alexandre Padilha, agora na Saúde.
Contradição entre campanha e governo
A definição de mulheres para cargos de primeiro escalão mostra a discrepância entre o discurso de campanha e a atuação como presidente. Lula adotou a bandeira da diversidade como forma de se opor ao antecessor, Jair Bolsonaro, na eleição de 2022.
Mas, ao ocupar o Palácio do Planalto, a prioridade passou a ser acomodar aliados políticos.
"Parece que [nomear mulheres] não é uma prioridade para ele, assim como não é para os partidos, que não indicam mulheres para os ministérios", diz Cláudio Couto, cientista político da FGV.
Homens substituem mulheres
Antes da substituição de Nísia por Padilha, Lula trocou Ana Moser por André Fufuca no Esporte e Daniela Carneiro por Celso Sabino no Turismo.
Das sete mudanças feitas até agora nos ministérios, três foram de mulheres para homens. Em outras três, homens entraram nas vagas de outros homens.
O único caso diferente foi quando Macaé Evaristo substituiu Silvio Almeida na pasta de Direitos Humanos, após ele ter sido acusado de assédio sexual. Na ocasião, a classe política defendeu que a escolha de uma ministra carregaria um significado simbólico por causa do escândalo envolvendo Almeida.
Ao assumir Lula nomeou 11 mulheres em 38 ministérios (ou órgãos com status de ministério). Agora, na metade do governo, elas são 9.
"Na primeira foto de ministério de Lula, logo quando ele assume, não tem nem um terço das pastas ocupadas por mulheres. Era o momento em que ele poderia ter trazido alguma mensagem de paridade", diz Denise Andrade. "A gente não vê o governo Lula pautando a igualdade de gênero."
As duas mulheres de confiança pessoal
As duas mulheres que Lula demonstra ter confiança e escutar com atenção têm uma relação pessoal com o presidente tiveram papel ativo durante o período em que Lula foi processado, condenado e preso na operação Lava Jato: a primeira-dama Janja e a presidente do PT, Gleisi Hoffmann.
Janja não ocupa cargo público, mas há inúmeros relatos sobre sua influência em políticas públicas ao longo dos pouco mais de dois anos de governo.
Gleisi está cotada para substituir Márcio Macêdo na Secretaria-Geral da Presidência na reforma ministerial a que Lula dá início com a mudança na Saúde.